Crônicas

As cidades

        As cidades guardam dentro de si mais do que ruelas apertadas, ruas largas, avenidas, janelas, carros parando nos sinais para as gentes apressadas passarem, e seguirem depois em loucas disparadas.
      Cidades são olhos nos olhando do alto dos edifícios. Espionando por fora de outros olhos que se escondem por trás de cortinas, vidros fumegados, óculos escuros em andares pendurados.
          O que a cidade enxerga? Como ela nos vê?
        As cidades nos comprimem no amontoado de pessoas, a se encontrarem sem carinho no esbarrar de ombros, encontros casuais de mãos. As suas ruas estreitas parecem comprimir os seus lados e os paralelepípedos dos calçamentos ameaçam saltar no ar. São escuras as ruas e amedrontadas à noite.
        Lado a lado, casas que se espremem ao longo do calçamento da rua, em uma briga louca por espaço. Transeuntes noturnos, cobertos pelo manto da noite, pés encostados nas paredes a observar o nada e, ao mesmo tempo, o tudo. Pequenos rolos de cigarros a circular pelo ar, para encontrar as luzes da iluminação pobre, pirilampos de névoa buscando a luz.
         Luzes saindo de janelas das casas, fornecendo um pouco de vida para a noite. Gritos, barulhos que ecoam pelo ar. Alguém grita, todos ouvem e não mexem um dedo. Apenas os olhos se movem: Morte.
         A iluminação do dia traz os contornos mais nítidos. Barulhos de vendedores apregoando a sorte que pode chegar, anúncios de pechinchas, lojas oferecendo objetos em bancadas nas calçadas. Mulheres em seus trajes de passeio ondulam pelas vitrines admirando os objetos de desejo ou para se exibirem a si mesmas as roupas novas, outras passam apressadas para alcançar a hora de atendê-las, burburinho: Vida.
      A chuva cai, de repente a rua esvazia, a população se espreme nas marquises, igualando ricos e pobres. Democrática, brinda a todos com a mesma benção. A rua de seca passa a molhada, coloridos espelhos dos neons nas poças d’água, interrompendo o fluxo dos vidros espelhados. A cidade narcisa se vê refletida no líquido.
          Um carro passa e mistura tudo.

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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