Crônicas

O ódio e o amor

        Honoré de Balzac disse que o ódio tem melhor memória do que o amor. Entre a balança da escolha o que seria o ódio? E o amor? Alguém sente o ódio por causa de um momento onde foi vilipendiado, foi massacrado, humilhado por outro. Da mesma forma a demonstração do amor vem de algum fato, acontecimento, gesto que outro alguém nos deu, de coração limpo, franco, generoso.
        Nos tempos atuais, no Brasil, e também no mundo, o ódio passou a ter outra conotação. É justo que pensamentos se oponham a posturas políticas, sociais, é um argumento do pensar, do achar que o caminho certo, correto é um e não o outro, ou o do outro.
        O ódio atual passa pela querença de uma suposta igualdade. Todos, em uníssono, queremos a igualdade, o fim de desmandos, o fim de desacertos sociais, que geram a criminalidade. Mas, passam por caminhos diferentes.
        A grande questão é por que odiar tanto. Por que ter ódio, exigir o distanciamento, na forma de vestir e viver, como se a existência do pobre fosse fator primordial para estabelecer o diferente? Manter o pobre como uma reserva de contingência.
         Igualdade para alguns não é igualdade para todos. Haja igualdade, desde que todos sejam como eu, ricos, brancos, bem nascidos. Isso é impossível. Ninguém nasce totalmente igual, ninguém escolhe, em sã consciência, nascer preto, pobre, em um lar já desfeito, ou ainda nem ter nascido. Somente aqueles que acreditam em carma, como solução para acalmar suas consciências, veem isso como justificativa.
       Existem duas ignorâncias que buscam espaços na sociedade brasileira: a ignorância dos desamparados socialmente, porque não recebem a educação justa e merecida, e explorando a própria necessidade criam discursos de libertação, mostrando com o próprio rosto, marcado pelas rugas das dificuldades, o discurso de forma crua, retratado na própria existência, no próprio fato de existir, e na outra, a ignorância na forma de protestar, com cartazes exigindo verdadeiras provas de não ter nenhum pudor de admitir que não leem a História, ou então nas formas grosseiras de estampar suas supostas indignações. Exibir sorrisos nos protestos, tirar a roup são o maior escárnio que se pode demonstrar pelo outro. Isso é ódio.
       Hipocritamente, as duas sociedades se encontram quando combatem a corrupção do outro. De um mesmo quando a corrupção grasse à vontade, mas mantenha o dólar barato e o financiamento fácil para adquirir bens de consumo. E do outro não aceitando a corrupção, mas, que do mesmo jeito proporcione um bem-estar. É o rouba mas faz; tanto de um lado para o outro.
        O amor se desfaz diante do menor contratempo. O ódio se perpetua. O ódio se alimenta do próprio ódio, até que as pessoas comecem a se ignorar, umas às outras. O ódio contamina, e, como o veneno que se infiltra pelo sangue, é difícil de descontaminar. O ódio já está instalado na sociedade brasileira. A pobreza culpa a riqueza pelo seu abandono. A riqueza culpa o pobre pelo próprio fato de existir. Os ricos, os bem nascidos, aqueles que lograram ter a oportunidade de estar no lugar certo, na hora certa, olham e desejam a vida dos outros povos, onde tudo é melhor. Não estão preocupados em transformar a sociedade brasileira, para isso teriam de sentir amor, e quando fazem caridade acham ter cumprido seu papel social. O ódio pede distanciamento.
        O que não percebem é que o ódio guarda a memória do desconforto, e chegará o momento em que eles se confrontarão. É inevitável. Por enquanto, escaramuças, depois a memória se transforma em realidade.

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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