Crônicas

Numismata

        A nossa língua, e as outras também é claro, tem umas palavras que são engraçadas. Digo, engraçadas no sentido da fala. Não dá para imaginar alguém, em uma conversa informal, usar o termo sem chamar a atenção. Numismata tem um pouco de engraçado, de alguma coisa de um outro mundo. E é, esse mundo numismático.
        Para um voyeur da conversa alheia, imaginando que esteja em um café, prazerosamente, bebendo seu líquido abarrotado de cafeína, se ouve, ao lado, alguém se referir ao outro como numismata, pensará o leigo não afeito à palavra que se trata de alguma teoria da conspiração ou, quem sabe, um novo tipo de café que não conste do cardápio.
       Evoluindo a conversa ele poderá observar que se trata daquele que cultua o estudo da moeda, em suma, um colecionador. Um sonhador que se perde mirando aquelas moedas de outros tempos e outros lugares, bem distantes.
       As moedas, para o colecionador, são guardadas em casa como um tesouro. O que poderemos dizer que aquele que guarda dinheiro em casa seria um numismata? Sim e não.
      Está aí uma boa desculpa para quem ganha aquele dinheirinho extra, ganho de uma forma pouco elogiável, pouco confiável, e que poderia se intitular colecionador, flagrado diante de uma batida policial, ao ser interpelado pela autoridade, diante da pergunta:
        – O senhor pode me dizer por que essa dinheirama em casa?
        Ele, puerilmente, poderia retrucar:
        – Sou colecionador, algum problema?
       Alguns têm tanto apreço que as armazenam na cueca, por certo, algum item extremamente valioso dentro do espírito do colecionador. Deve ser triste para esses ver o seu esconderijo de numismata descoberto.
      Voltemos ao voyeur da conversa no bar tentando decifrar o numismático, o mundo fascinante das moedas. Que tem um pouco de lunático, carismático, enfim, um mundo para poucos, fascinados, debruçados sobre as suas valiosas coleções, isso lá tem.
       Não sei se os numismatas teriam tanto apreço por moedas do alheio quanto os colecionadores do dinheiro alheio adorariam ser considerados como numismatas.
     O numismata tem orgulho do seu hobby, diferente do colecionador de dinheiro, ao ver a descoberto o fruto da sua coleção, exclamaria, indignado:
         – Quem, meu? Imagina, eu nem sabia que isso estava por aqui?! Um numismata jamais abandonaria sua coleção, ao contrário de alguns…
        Enfim, enquanto alguns prezam por sua coleção outros abrem mão dela, depois de tantos sacrifícios, por várias razões, dentre as quais a perda da liberdade.
      Nosso voyeur de bar sorri, aliviado, quando, afinal, compreende o significado da palavra. Isso impediria que pedisse um numismático, se constasse do cardápio, talvez um outro tipo de café com cheiro forte de… laranja.

Fonte da foto: Photo by Mathieu Stern on Unsplash 

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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