Crônicas

Por que as mães vão embora?

        As mães nunca deveriam ir embora. As mães deveriam sempre estar chegando. Chegando para uma conversa, trazendo o bolo quentinho, o café sempre fresco, o cheiro do arroz fritando na cozinha, trazendo termômetro, que as suas mãos já mediram a temperatura na testa da gente e ele, o termômetro, é só para confirmar.
     Mães deveriam sempre estar chegando, não indo embora. Chegando para trazer o casaco esquecido no esquecimento da teimosia, o chá milagroso da tia que cura o mal estar, o mal de amor e as decepções. Mães não deveriam ir embora, porque são sempre aquelas que lançam a última reza, o último olhar antes do primeiro dia de aula e do primeiro emprego.
       As mães nunca deveriam mostrar suas costas, mas sempre o seio aberto para o alimento, para o chegar devagar do choro que deságua, as mãos sempre abertas para o abraço infinito, aqueles braços que parecem o abraçar de nuvens, de sofás macios, de algodão já amortecido, sempre macio, sempre no vai e vem. Mães são cadeiras de balanço vivas.
       Mães não deveriam ir embora, porque não esquecem os pratos preferidos, não deveriam deixar a mesa da cozinha sozinha, das conversas ao pé do ouvido, quando se mostram menos mães e mais humanas, a confessar pecadilhos das vizinhas, dos parentes, sempre com o dizer do: eu avisei!
       Mães sempre avisam do que não lembramos, irritam com as suas teimosias em insistir no óbvio, por isso mães não deveriam ir embora.
     Mães nunca deveriam ir embora, porque os seus rostos escondidos aguardam nas janelas a chegada do filho noturno, que chega do perigo e finalmente ela pode cerrar os olhos e ir dormir tranquilas.
       Mães sempre deveriam chegar para receber os netos que correm na sua direção, porque sabem que a avó é uma mãe maior, com o seu acocorar da espera dos abraços, dos beijos que molham, e os pequenos não enxugam a bochecha porque sabem ser o tempero do gostar.
      Mães são aquelas que os heróis pensam na refrega, na hora do medo, que vem do infinito, do celeste, deixando o Senhor por um instante, para atender no pensamento, o soldado que jaz por terra.
     Mães não deveriam ir embora, mas existir para todo o sempre, e se as mães fossem eternas, sempre poderiam puxar as orelhas dos filhos que acham que a solução das coisas do mundo são coisas de guerra.
      Por que elas vão embora? Não sei, talvez para que este circuito infinito de mães não desapareça.

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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