Crônicas

Livre como um pássaro

         Algo que está na boca do povo é a palavra liberdade. Alguns, para expressar isso, definem situações de liberalidade com a expressão “livre como um pássaro”. Realmente, um pássaro é livre? Se fôssemos como ele, seríamos livres?
        Aproveitando algumas reflexões de Jacques Mauritain em seu “Princípios de uma política humanista”, a prisão de um pássaro está na natureza, na suposta liberdade de sempre concluir o círculo natural da vida. Assim como os animais na África, que realizam a sua peregrinação anual percorrendo os mesmos caminhos pela savana à fora. Passarão eles pelas mesmas pradarias, as mesmas florestas e os mesmos rios, onde vadearão até a outra margem, lutando contra os mesmos crocodilos que os atacam, e servindo aos leões as refeições que lhes apetecem.
       Portanto, uma liberdade subordinada às leis da natureza, onde seu único caminho livre é percorrer os mesmos lugares, é liberdade? O ser humano foge muito disso?
        Logo, estamos diante do processo de independência. Ser independente é não depender do outro e não depender da natureza, encontrando as mesmas coisas e necessidades em outros lugares, ou então, não depender a sua sobrevivência na procura do clima mais ameno, mas, enfrentá-lo a partir de uma tomada de consciência que nos faça revoltar-se contra aquilo.
        Se dependemos mesmo assim de alguma coisa, não somos totalmente livres, mas dependentes de situações que a natureza e a sobrevivência nos impõem. Viver em sobressalto, mesmo que coberto por uma segurança, no caso o convívio com os próximos, ainda não é a liberdade.
        Escolher o seu lado, o livre-arbítrio, é uma forma de escolher, mas, subordinada a um processo obrigatório, mesmo que aquele caminho lhe outorgue benefícios, mas é sempre escolher entre dois, e nada mais, ou então nada fazer, o que não deixa de ser uma escolha que oprime, pela insatisfação de não se poder fazer algo por nosso benefício, e sempre preso às barreiras econômicas, sociais, culturais e geográficas.
         Liberdade, igualdade e fraternidade é o dístico da bandeira francesa, o ideal de vida de uma determinada gente em um determinado momento do mundo. Mas, se a liberdade precisa da igualdade e da fraternidade, ela não é por si mesma um estilo de vida alcançável. Entendemos a liberdade como um bem em si mesmo, suficiente por si mesmo. Buscamos a liberdade como uma tomada de consciência, autossuficiente: Um fim em si mesmo.
Se a liberdade necessita de algo que a complemente ela não é liberdade nem para ela mesma.
        Não existe a liberdade de cada um, porque não se é livre com níveis de liberdade. Liberdade é uma coisa só, mas cada ser humano é livre na medida do possível, até porque não é independente, nossa vida é em sociedade, não podemos escolher o que queremos, estamos subordinados às contingências do cotidiano, onde sobreviver é imprescindível, e não saímos por aí, simplesmente porque temos de ganhar a vida.
        Assim sendo, não nos basta ser livres, porque a liberdade é consequência e não causa, ninguém executa alguma coisa porque quer, e portanto não é livre. Ninguém decide alguma coisa porque assim a cabeça decidiu. E não fazemos isso porque dependemos de que o outro queira e da sua capacidade de reação.
       O pobre não é livre porque depende dos benefícios que pode adquirir de alguém com mais posses e o rico não é livre porque depende que outros existam para que a sua riqueza sobreviva. Só se é rico ou pobre porque um e outro são referenciais de um e de outro.
        Liberdade é igual à igualdade e fraternidade, e logo, liberdade é quando todos somos iguais, e não dependemos do outro, a não ser para ajudar nessa igualdade. Ser livre é ser igual. Momento em que não necessitamos dessa liberdade, porque ela, simplesmente, é.
        Nos momentos em que invocamos a palavra liberdade, pensemos em igualdade, como liberdade de expressão, igualdade de expressão, quando em vez daqueles que têm o poder podem se exprimir, porque têm acesso aos meios de expressão, junto com aqueles que não têm acesso e possam se expressar de forma igualitária.
        E assim vamos colocando a palavra igualdade no mesmo nível de liberdade.

Fonte da foto: Photo by Taneli Lahtinen on Unsplash

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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