Crônicas

Eufemismo

        Eufemismo é uma figura de linguagem que usamos quando queremos atenuar alguma expressão ou palavra de cunho, digamos, grotesco, que tem algum aspecto ruim, descrevendo-a de uma forma agradável. Mais ou menos como falar aquilo que é, de uma outra forma, ou a arte de transformar o mundo desagradável, dizendo que a coisa não é bem assim.
       A figura de linguagem serve para justificar, através de uma definição, o que as pessoas fazem no cotidiano de uma forma atenuada, algumas vezes irônica. O eufemismo foi inventado depois que o primeiro sujeito apresentou uma desculpa esfarrapada diante de uma imensa bobagem que ele acabou de fazer.
      O eufemismo serve também para mentir. Afinal, quando a gente apresenta uma palavra que pode transformar a realidade em uma coisa palatável, isso é um eufemismo, baseado em uma mentira. Tipo quando uma enfermidade abala a humanidade, causando mortes pelo planeta inteiro, podemos reduzi-la a uma gripezinha. Se ela atinge determinadas pessoas que se dedicam aos esportes, dentre elas aqueles que se dedicam à arte de mentir, isso não é eufemismo, é mentira mesmo.
        Mentira é um dos sentidos que o eufemismo à brasileira assume. Talvez, daí, essa fina arte da delação ter se tornado uma pandemia, banalizando o termo, o que justificaria o uso do eufemismo como premiada, restando saber a quem caberia o prêmio: é uma delação, mas premiada.
       Delação é a arte do eufemismo e, no Brasil, poderia ser considerada como a arte da mistificação. Afinal, se você usa um termo agradável para encobrir algo desagradável, isso não passa de um eufemismo barato.
      Pobres, então, são o maior exemplo do eufemismo, quando suas presenças são solicitadas para festas beneficentes, fazendo loas das suas presenças e da grande benemerência do produtor, encobrindo, no fundo, um pedido subliminar para entrar no céu o tal benfeitor.
        Assim, eufemismo podemos considerar como uma maneira de escamotear o que, no fundo, nós desejamos. E poder é o exercício do eufemismo, porque não é desejado diante de todos, mas amplamente aguardado no privado do nosso interior.
        Por isso, talvez, a palavra comece com a primeira pessoa, o eu. Para alguns, se esconder da verdade, como o Candide, o inocente de Goethe que vaga pelo mundo, não encontrando ou justificando os defeitos do ser humano, seja uma das formas mais interessantes do eufemismo. Aos que praticam a arte de eufemismar tendem a eleger, como seus preferidos, aqueles que se profissionalizam na arte. A arte da política é uma arte do eufemismo.
        Afinal, prometer o que não poderá cumprir, por não se desejar, ou por incapacidade, tende a se justificar com a presença de forças ocultas, ou com o famoso eles, aqueles que nunca sabemos quem são, mas estão presentes para atrapalhar os planos de alguém.
       Portanto, se alguma coisa não der certo, basta pôr a culpa… neles, uma forma eufemística de dizer, não consegui porque não deixaram. Esse sujeito indeterminado é um eufemismo dizendo que perdi a maioria, me dei mal, e daí!
        A arte do não é bem assim, não é o que você está pensando, se tornou um lugar-comum. Como a arte de tornar agradável o que não é, logo, logo, o cheiro acontece, o eufemismo deixa de existir e o culpado aparece.

Fonte da foto: Photo by Toa Heftiba on Unsplash 

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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