Crônicas

De volta para o aconchego

        Aconchego é chegar a algum lugar, seja na porta de casa, na presença da pessoa apaixonada, no coração querido. Aconchego é a reza escondida que conforta a alma, declamada baixinho no silêncio do quarto, são as palavras que jogamos no alto, na esperança de Alguém que desejamos que exista, que as receba em Seu colo e nos atenda, porque nos aconchegamos a Ele sempre nos momentos mais precisados e também naqueles preciosos quando conquistamos o nosso desejo guardado.
        Aconchego está no aceno de longe, quando somos reconhecidos entre muitos, na multidão, quando aquele sorriso se expande à vista da nossa simples presença, descendo de um ônibus, de um avião, vindo de algum lugar distante. Está no correr para os abraços, nos risos, nos deboches engraçados que fazemos com aqueles que amamos.
        É bom quando voltamos para o aconchego porque é como se aquele lugar nunca nos abandonasse, seja uma paisagem que guardamos desde criança, um simples cheiro de flor em um jardim onde encontramos nosso amor de outros tempos. Está na lembrança de um beijo porque é no conforto de nossas coisas boas, acontecidas, que nos revigoramos de tempestades nos tempos presentes.
        Todos nós temos nosso aconchego. É quando a noite desce e nos enrolamos em nossos travesseiros e imaginamos fantasias sobre o que poderíamos ter feito. É quando choramos sem motivo algum porque esses momentos não são de fraquezas. É quando choramos por injustiças e nosso aconchego não está em nada poder fazer. Mas, o simples fato de querermos que o mundo seja melhor é a melhor maneira de demonstrar o quanto de bom temos dentro de nós.
        São nesses momentos em que demonstramos para nós mesmos que o mundo não deveria ser assim. Que comparamos as vidas daqueles que sofrem às nossas vivências.
        É quando nos aconchegamos perto Dele.
        Porque se imaginamos que o mundo não pode ser assim como é, se existem injustiças, ódios e falta de amores. Quando vivemos em um mundo impossível, de disputas desnecessárias, de ganâncias extremadas, pela razão de que as coisas são assim, geridas em nosso íntimo. Quando entendemos que as coisas não podem ocorrer dessa maneira e nos sentimos incomodados com isso, é que nossa alma, nossas lembranças mais guardadas nos lembram do aconchego de que já habitamos um outro lugar, mais justo, onde a irmandade realmente existe.
        Porque o entendimento de que o mundo é injusto vem do fato de já termos vivido a justiça plena em algum lugar. A comparação é a consequência de que estaremos de volta para o nosso aconchego algum dia, e a certeza de que Ele existe, com certeza.

Origem da foto: morguefile.com

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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