Opiniões

A diferença entre o mito e a realidade

     A grande diferença entre os governos do PSDB e do PT é a série de escândalos que, supostamente, foram inventados pelo último. Em uma fala atenuante, o ex-presidente FHC disse que a corrupção sempre existiu, mas foi no governo petista que ela se institucionalizou, alcançou teias de crime organizado.
     É a argumentação de dizer que eu fiz, mas, nunca alguém fez tão melhor do que eu, logo o meu mal é menor.
     Um fato é um fato quando ele alcança as reverberações das notícias. A informação tem uma forma de se multiplicar e se reproduzir, quando organizada, também, em uma forma de teia, no mesmo nível de um crime organizado.
     Como seria a cobertura de fatos nos governos do PSDB com a mesma reverberação com que a mídia orquestrada organiza as informações? Os exemplos na nossa História são enormes, sempre sendo os grupos de informação reverberando um lado e atenuando o outro.
     É claro que usar o argumento de que tanto se fez neste país, e tanto se fez para que os fatos viessem à tona, é usado ao extremo pelos governos petistas, mas a sociedade, da forma como é organizada, ou seja, com as forças sendo exercidas de cima para baixo ganham os aspectos que as intenções ditam, e se reproduzem de acordo com os interesses.
     A quem interessaria uma nova forma de organizar a sociedade? Aos menos afortunados, àqueles que não têm bens a defender ou apenas têm os bens suficientes para uma sobrevivência digna. O que afetaria a sua vida se os ricos fossem menos ricos e pagassem mais impostos? A sua casa, o seu emprego deixariam de existir? E qual a forma, a maneira de dissipar a ideia de taxação dos mais ricos? Reverberando a má condução dos impostos e desvios, quando muitos desses desvios e distribuição de organismos de comunicação são ou uma forma ou maneira de desvio de verba pública.
     O bombardeio contumaz de escândalos é a maneira que os grupos financeiros, baseados na mídia, encontram para afastar o real mal da sociedade: o irrisório imposto que os ricos pagam.
     O discurso divulgado pela sociedade organizada pela elite, e não está aí nenhuma alusão à elite porque são ricos, mas às elites, ou grupos financeiros e não financeiros que sempre se beneficiaram de decretos governamentais ou de polpudas verbas para a sua riqueza, oriunda do dinheiro público e dos braços dados com os ditadores de antão, prega a livre iniciativa, desde que essa liberdade não atinja seus interesses.
     Em rápida passagem, podemos separar os milionários do Brasil entre aqueles que, realmente, criam riquezas a partir do trabalho, aqueles que criam riquezas organizando lobbies nos contratos do governo, e aqueles que herdam as riquezas que foram conseguidas através dos mesmos artifícios espúrios, a bajulação e o envolvimento na política como forma de manutenção do poder.
     Atacar, diuturnamente, os malfeitos dos adversários nada mais é do que criar uma cortina de fumaça para encobrir os próprios malfeitos. É claro, que é dito que a esquerda cria o “saco de maldades” com dor no coração, ignorando o fato de que os movimentos e políticas sociais apenas visam ao equilíbrio da sociedade. Em compensação, a direita, ou aquela que se opõe aos grupos que trazem benefícios sociais, veem no “saco de maldades” um ajuste natural da economia de mercado, e a conta tanto de um lado como de outro sempre recai sobre o mais fraco. A diferença é a forma como esse impacto se realiza.
     Afinal, a sociedade organizada e pacificada apenas deve olhar um horizonte onde todos poderão, livremente, optar pelo seu futuro.
     Recordando o filme Matrix, a sociedade é organizada quando a ideia da conquista natural pela meritocracia é um fato natural, somente esquecendo-se de dizer que não há para todo mundo, e que a troca pela sonhada ventura é, na verdade, a prisão, sem que se perceba o fato. Cabe à mídia propagar a ideia do livre mercado, como forma de enriquecimento, e se esquecendo de dizer que poucos chegam lá, e a briga é injusta.
     Ou então, desmancha-se a Matrix e a terra arrasada vem para bordo de nossas vidas.
     Escancarar os malfeitos, trazê-los à realidade, é um pouco o desmascaramento do real. Afinal, poucos transitam no limite da irresponsabilidade e sobrevivem, a não ser com a mão amiga da propaganda.
     A questão é como tratar o fato, afinal remoendo a memória como seria o tratamento dos diversos casos de governos anteriores trazidos ao mesmo holofote e discursos raivosos de hoje?
     Queremos uma sociedade mais justa, onde a riqueza seja distribuída para todos. Quando o país enriquece, os ricos ficam mais ricos e os pobres também, mas quando o país empobrece, os ricos permanecem ricos e os pobres empobrecem. É preciso acabar com essa organização e mostrar que a nossa sociedade não está pacificada, apenas vive nas teias da Matrix.

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura