Crônicas

Uma questão de coragem

        Não vá procurar a definição de coragem no dicionário. Lá, existe simplesmente palavras enumeradas. Procure o sentido da coragem dentro de você mesmo, porque cada um de nós tem o seu nível de coragem. Embora escondida no medo que todos nós sentimos, mas, acredite, a coragem está lá dentro.
        A coragem não está nos atos heroicos de se jogar na frente de alguém em perigo, no enrolar a bandeira no protesto, isso são atos do ser humano em defesa de si mesmo, do outro, da sociedade, é o calor humano que transborda e mostra a cara do que é fazer parte de uma verdadeira humanidade.
        Ela, a coragem, está em pequenos atos do dia a dia. Quando jovens, ela está no não, isso, na palavra não, estas três letras, com a bandeirinha acenando em cima para manter o alerta. Na juventude, quando o mundo nos abraça com suas maravilhas desconhecidas, nos seus medos, o não é a palavra corajosa que dizemos para evitar o indesejável. Mesmo quando o desconhecido não nos dá a certeza do correto, é o não, decisivo, que nos afasta do perigo: da corrupção do corpo, da alma, do ilegal, do bajulatório. Na dúvida, diga, simplesmente, não, e ignore, corajosamente, os apupos, as vaias, o desdém daqueles que querem subverter o seu caminho. Ande, corajosamente, no meio do adulatório, da vitória fácil, e trilhe o difícil caminho até o objetivo final. Para alguns até esse não é fácil, para outros é difícil, por isso que a coragem não é igual para todos. Para uns ela é mais forte.
        Depois que você se aprova, a juventude vai passando e a maturidade chega. É a hora do sim, estas três letras, com um sinal de infinito em cima, mais clara, sem o negativo, o ensombrecido da caminhada. Vida vivida, é a vez do sim, eu topo, eu topo me aventurar, andar sobre caminhos desconhecidos, com o medo ao lado, não mais acima, apenas para servir de balizamento até testar alguns limites.
        É a coragem para falar e dizer, olhar nos olhos, expressar o eu quero sem ofender, mas, sem se deixar ofender. De dizer isso não me satisfaz, porque posso fazer melhor, sou melhor do que isso, se desfazer de comprometimentos. Eu te trato com educação, logo exijo o mesmo. Encarando o mal humorado, o mal educado, o de mal com a vida, vendo no olhar opaco do outro apenas a oportunidade de ironizar, ofendendo com a nossa elegância. É hora de fazer acontecer. Porque a indiferença diante da desfaçatez do outro não é covardia, mas coragem de não querer ser igual, ser infeliz como o outro para esconder a nossa própria felicidade.
        A coragem aparece quando, em frente ao espelho, você não se pergunta o que eu sou, mas, o que eu vou ser.

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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