Opiniões

Por que um país partido?

POR QUE UM PAÍS PARTIDO?

     Por que um país partido e não um país dividido? A escolha das palavras para definir a “eleição mais suja da História” é muito bem defendida por aqueles que têm na própria partição o motivo de argumentação.
     O que se entende por país partido? A colocação apenas diz que existe uma divisão irreconciliável, patrocinada pela diferença de três milhões e quinhentos mil votos para o escolhido pelas urnas. E aí é que está a questão: não há vencedores em uma eleição, mas, escolhidos.
     Quando se define a partição, pressupõem-se vencedores, como se a divisão fosse o ranço que o derrotado guarda, da mesma forma em que o placar de um jogo de futebol não sai ao agrado da parte derrotada. Alega-se gol de mão, árbitro mal intencionado, mau comportamento do adversário, todas essas coisas. Ao definir a eleição como a “mais suja da História”, a colocação lembra o mau perdedor, como se em todas as eleições em qualquer país democrático (e vemos exemplos na França, EUA), não existam as roupas sujas que se lavam em público.
     Parte-se o país no momento em que algumas vozes, que não representam os votos contrários ao escolhido, porque muitas vezes estes foram votos úteis, de puro revanchismo, como o ser antiPT, e não propriamente um voto utilizado para eleger um escolhido de fato, mas define outra coisa: que os votos que escolheram um candidato foram mais por convicção, por se acreditar que a vida é melhor hoje e não o melhor era antes, dividindo, aí sim, o país entre aqueles que melhoraram de vida e os que gozam de um patamar de vida satisfatório, inconformados que ainda persistam diferenças, e, do outro lado, aqueles que imaginam que o país pode e deva ser governado por uma classe mais “esclarecida”, que se julga iluminada pelo discernimento e que pode ditar o que é melhor para o outro lado.
     Ao definir a parte escolhida como idiota, ignorante, beneficiária de programas sociais ou cúmplices, essa outra parte ignora a democracia e se comporta como ignorante das próprias lições da História recente do país.
     Faz parte do partido da má vontade, e de tão fascistas são em suas assertivas que se sujeitam à subordinação de uma ditadura militar, comportando-se como prestimosos colaboradores de cabresto para uma elite de truculentos, pregadores de ditaduras em plena democracia. Ou seja, querem partir para a obscuridade, na sua inconformidade da derrota.
     Daí, alguns representantes que tentam inventar um discurso proclamam a partição do país, cegos ante a divisão social que vai cada vez mais se aproximando da igualdade, como um rolo compressor.
     Ao pregar que o país está partido, pregam o terrorismo de direita disfarçado nos melhores discursos fascistas de uma terceira via que venha como um deus ex-machina a salvá-los todos da própria mediocridade.

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura