Crônicas

Palavra em vão

        Nunca diga em vão a palavra Amor. Guarde-a, como se fosse o seu segredo maior. Não a diga para qualquer ouvido que apareça, por mais que o perfume te ofereça o inebriante prazer de afinal ter descoberto aquele alguém. Não, que sucumbir ao ébrio perfume seja uma fraqueza sua. Ela, a palavra, é de todos, e por isso devemos estar atentos.
       Não escreva a palavra Amor como mote de um poema. Que ela não sirva para que você externe sentimentos represados, não correspondidos, porque você estará amando alguém idealizado, e por não existir de fato, não fará sentido.
       Imagine o quão grande a pequena palavra encerra. Amor é algo pequeno, como uma pílula que você toma a contragosto, surpreendido. Mas, dentro do corpo ela se expande, desatina, leva a um transe, o raciocínio se inclina a julgar como certo aquilo que você tem certeza que é engano.
        Ainda a guarda, dentro de ti, a palavra? É sinal que ou você se defende de algo que não conhece, ou realmente a palavra jaz no pensamento, na sua boca e a língua inerte não ousou pronunciá-la, ou você, seleto, tímido não julgou que aquele ouvido a mereça.
     Também não seja egoísta, a ponto de preservá-la tanto. É preciso discernimento e isso, meu caro, não se ensina, aprende-se no dia a dia, experimentando nas palavras de outrem que você ouve, mesmo aquela que te diz: “Te amo tanto!”.
      Enfim, quando encontrar o motivo da sua falta de raciocínio, e aquela voz, aquele rosto, que você não esquece, que ocupa sua mente, te causa desconforto, um misto de alegria e medo, insegurança, algo que tire você do equilíbrio por tantas vezes resguardado, saiba que chegou a hora. Ele, finalmente, bate a sua porta. Dizê-la, nessa hora, não é jogar a palavra no espaço. Ela se perderá, com certeza, porque não tenha você a certeza de uma retribuição: amor com amor nem sempre se paga. E se ele não for oferecido de volta, não se importe com isso.
       O Amor é egoísta, ocupa espaços, te causa ciúmes, esse fruto, esse filho bastardo da virtude. Portanto, ao dizer amor não espere o pagamento, se espera não é amor o que te embala nesse momento. Na voz do outro é só vontade de querer, de possuir, não está amando, está desejando.
       Amar é dar liberdade e aguardar no silêncio que o teu amor seja suficiente para que o outro amor se sinta tão seguro, que não restará a ele, ao outro, retribuir no mesmo tom, porque a união de dois amores é um casamento.

Fonte da foto: morguefile.com

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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