Crônicas

O que queremos ser ou o que podemos ser

        A diferença entre aquilo que desejamos ser, desde muito jovens, e aquilo que a vida nos dá em relação às condições sociais e econômicas que ela nos oferece faz com que nossas escolhas não sejam muito grandes. Os sonhos existem para serem exercidos, execrados ou esquecidos. Feliz daquele que sonha, tem as condições para estabelecer estratégias e consegue seus objetivos. Vivemos em uma balança lutando por nossa sobrevivência, a grande maioria da população, e contra nós aqueles que combatem essa igualdade, essa possibilidade de ir além da sobrevivência e realizarem-se sonhos. O mundo não é para todo mundo. Vivemos um paradoxo, onde a liberdade do ser é muito grande a ponto de ocupar espaços onde não temos pertencimento e ao mesmo tempo vivemos cerceados. À força de ideologias, de falsos incentivos, uma suposta igualdade é vendida como coisa fácil e, ao mesmo tempo, a outra mão retira todas as pontes para que outros se realizem.
       O que queremos ser está algumas vezes, ou, infelizmente, no mundo de hoje, ao nosso alcance, mas é impossível atingir. Optamos por aquilo que podemos ser, achando que em algum momento seremos, exatamente, o que sonhamos. E nesse sonho-pesadelo a vida caminha a largos passos rumo a um nada ou rumo a um possível fim. Na ânsia de ser, trilhamos caminhos percorridos por outros, imaginando que seguir os mesmos passos se chegará ao mesmo final. No entanto, é impossível copiar trajetórias quando há tantas diferenças entre nós. Um país, um mundo são formados não por aqueles que querem ser, mas por aqueles que podem ser. São aqueles que se submetem para proporcionar que outros possam ser o que queiram. A luta é árdua e o processo injusto.
         O que seria do mundo se todos pudessem realizar seus sonhos profissionais, seja em qualquer campo de atuação da vida humana? Os que tentam são revolucionários, o que se torna um absurdo: fazer-se uma revolução para voltar um caminho de normalidade e de luta justa por sonhar e realizar o ser. Outros sabotam a revolução dos hábitos à força de manter o seu espaço e dos seus para sonharem em separado.
           No final das contas, todos podemos ser o que queremos ser. Não há diferenças tão grandes entre nós que não nos iguale. Sim, há diferenças. E estas diferenças não são motivos para que haja espaços entre nós. O que seria do mundo se as oportunidades fossem as mesmas? Todos aceitariam a concorrência livre como se prega? O poder e o dinheiro passariam de mãos em mãos sem se eternizar na mão de poucos. Porque dentre os poucos que podem ser haverá aqueles ou os seus não tão capazes. Como eu disse, uma trajetória não se copia, mesmo que venha de descendências. Com isso outros atores entram no palco para questionar seu espaço e deslocaram deles aqueles que se julgam eternos protagonistas de um sonho possível, impossibilitando os sonhos aos outros, renegando-os a, simplesmente, tentarem o que podem ser.

Origem da foto:  Foto de Gleb Lucky na Unsplash

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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