Crônicas

Existem livros

        Mesmo que em sua estante existam aqueles livros clássicos, de Machado a Eça, dos autores russos, dos americanos, daqueles autores da moda, teóricos deslumbrantes e as suas formas de modificar o mundo, com certeza, tem aquele que você recorre sempre. O meu é um simples livro de poesia de Guilherme de Almeida – Messidor.
       Quem foi Guilherme de Almeida não importa, importa que ele me toca todas as vezes que eu o leio com os seus sonetos simples, perfeitamente rimados, obedecendo a uma cadência que dialoga comigo.
       Imagino que muito se cobra da leitura de poetas ou prosadores consagrados, quase que como uma obrigação para fazer sucesso em rodas de conversa, ou mostrar uma intelectualidade mundana. Ler não é isso. Ler é uma forma de prazer que não é universal, mas, particular, e ver o mundo, ou o mundo particular de um poeta entrando na nossa sala.
      “Vamos, portanto, como dois estranhos, deixando para trás o nosso ninho! Desmancha ao vento, os caracóis castanhos do teu cabelo, e vai devagarinho”.
       É esse vagar, bem devagarinho que me acalma. Não há um compromisso em achar o tal: o que o poeta quis dizer. Aliás, quando alguém sugere isso em uma conversa, eu me pergunto se não é por demais pretensioso imaginar o que um ser em alto grau de inspiração quis dizer.
     Não é preciso encontrar o que se quis dizer, mas, o importante é entrar no clima do que se diz, imaginar aquele devagarinho entrar no seu pensamento e se deixar levar pelo que o poeta diz, navegando em suas rimas, nos seus encaixes, nos seus finais.
      Afinal, a poesia é ou “Era uma história simples e sombria que a minha velha pajem me contava. Eu tinha a graça da inocência – e ouvia; ela, o encanto dos velhos – e falava”.
     Me inspiro sempre nas poesias, quando alguma ideia me ataca e ela não se verbaliza, e quando não entendo o mundo recorro aos livros, pensamentos de outros que viveram uma vida de atropelos, de aventuras e de conhecimento de outras terras, ou habita em pensamentos de outros. Transformo em poesia, para deglutir o mundo, copiando e me inspirando em poetas, para que mais tarde ela diga o que finalmente eu quero dizer.
        Ao mesmo tempo, me realizo e busco ideias nos versos dos poetas, e tento imaginar o que eu poderia dizer a partir daquilo que ele diz.
      Quando estou cansado da leitura, e tento conversar com o mundo, entendê-lo, amá-lo, ou simplesmente ouvi-lo, através de outros, me abraço com Guilherme de Almeida, mesmo quando alguém me diz: Guilherme, quem?

Fonte da foto: morguefile.com

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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