Crônica do amor
Só tem dois jeitos de amar: de supetão ou devagarzinho. Coisas tipo você vai passando e, de repente, vê aquele objeto do desejo entrar em uma sala, pedir um picolé na padaria, parar de carro no sinal e os seus olhos batem como se descobrisse uma roupa diferente na vitrine. Você olha e não consegue mais parar de pensar naquele desejo.
Sei lá, é o caso de sentir atração pelos olhos rasgados de um japonês ou japonesa e aquele objeto de desejo parecer, não se sabe por que que os olhos são meio rasgados, o jeito de andar fica diferente e a voz, ah! soa diferente. É o único no meio da multidão. E você para para ouvir aquela voz. E a imaginação segue solta, as estratégias de aproximação começam a tamborilar na cabeça da gente.
Ou então ele vem devagarzinho, quase sem se fazer notar. Nascido de uma implicância, de trabalhar junto, rir das mesmas coisas, sem querer ter visto o mesmo filme. E cada um para o seu lado, namorando pessoas diferentes, e surge a oportunidade de fazer alguma coisa juntos, subitamente as mãos se encontram, dá um frio que nunca se sentiu, uma corrente percorre o corpo, e os olhares se encontram e parecem querer dizer alguma coisa, e ele vai nascendo, surge um convite, mas, não um convite igual aos anteriores, dessa vez há uma indecisão no ar, uma apreensão por uma negativa que se sabe que não vai vir e, bem… as coisas acontecem.
Mas, mesmo assim, ainda não é o amor, é verdade. Isso que nasce é um redemoinho de galáxias que se encontram, uma espécie de dança que aproxima, um certo respeitar de espaços, as forças do antinatural se instalam, nós não somos mais os mesmos.
Amor é quando a gente acorda de manhã e olha o rosto do objeto do desejo, os olhos fechados, ainda dormindo e fingimos dormir também só para prolongar os momentos de proximidade, sem falar, sem dizer nada.
Amor é sentir, subitamente, que o outro não está presente, e, mesmo que tenhamos esquecido de ligar, saber onde está, o que faz, vem uma sensação de tristeza, nem que seja por um instante, que a falta do outro que passa fugaz, indiferente se estamos ali pensando nele, nos dá uma sensação de perda.
Amor é não querer dividir, e o prazer de estar sempre perto, sabendo que o que se pode fazer com qualquer um ou uma pode ser feito com quem está ao nosso lado. É possuir sem ter, dominar sem necessitar, chamar sem falar, ouvir no silêncio. É olhar para o lado e não se sentir sozinho, mesmo que rusgas aconteçam, e que os instantes onde a complicação acontece baixa uma certeza de que aquilo é totalmente passageiro.
Amar é querer, sem saber, de verdade, se somos amados também.
Amar é dizer lembre-se e não, não se esqueça. Amar é constituir um lar feliz, porque o amor é egoísta, não admite divisões. É ter um teto onde se pode voltar e dormir, é saber que passado dia os dois vão se encontrar como se o afastado fosse perto e o longe levado agarrado dentro de nós.
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