Crônicas

Bagunça e atividade

         Têm coisas no mundo e na vida que não são o que parecem ser. Por exemplo, alguém muito silencioso passa a ideia de timidez ou alguém muito extrovertido, que cantarola música e está sempre fazendo piada, mas, no fundo, é completamente diferente daquilo: tipo lobos em peles de cordeiros e cordeiros com a pele deles.
           Político e economista explicando as coisas como deveriam ser, escolhendo as palavras mais mirabolantes e circunspectas, bem longe do entendimento normal que as pessoas possam alcançar. No fundo, no fundo, passa uma intelectualidade que não é mais do que uma máquina de lero lero.
         Alguns têm a capacidade de não fazer nada e passar a ideia de que estão fazendo tudo, tudo aquilo que não tem nenhum sentido, não leva a lugar nenhum, e, no entanto, fica aquela impressão de que têm a solução das coisas, mas …
        Tem o youtuber e o influencer que gostam de desancar com todo mundo. Nas suas palavras estão o canalha, o vagabundo o isso ou o aquilo. Cria aquela borbulha toda, todo mundo presta atenção, o sujeito passa por corajoso, valente, e quando os vitupérios começam a escalar os degraus mais altos de quem pode retaliar, a coisa desanda, e depois ele finge uma doença, se interna no hospital, e fica ali, meio em estado comatoso até que passe tudo, e fica o dito pelo mal dito.
       Criar confusão é uma das melhores táticas para não se chegar a lugar algum. Afinal, quando se discute algum assunto, e as partes resolvem por uma questão de nível intelectual manter as palavras em um patamar elevado, tudo parece estar organizado. No entanto, quando uma das partes vendo-se perdida resolve baixar o tom, toda a discussão ganha ares de retaliação, e enfim, o organizador da confusão sai vitorioso, e parece até ter melhores dotes intelectuais do que realmente parece.
         É claro que toda essa balbúrdia não existiria se não houvesse o espectador, que se comporta não como o fiel da balança, mas envolvido em uma briga de arquibancada que também não leva a nada.
         Bagunça e atividade têm o mesmo aspecto de movimento. Uma casa bagunçada pode ser um sinal de que alguém a bagunçou de verdade ou então se entregou a alguma atividade frenética que nem conseguiu deixar tudo arrumado.
        Se entramos em uma repartição pública, em uma administração privada, vendo aquele pessoal passar pra lá e pra cá com papel na mão, pode lembrar que uma atividade produtiva está ocorrendo, ou então essa atividade não passa de encenação, como quando alguém grita “Lá vem o chefe!” e num passe de mágica as pessoas arrumam o que fazer.
        Na época da ditadura, quando a inflação estava a todo galope, ou então a repressão estava muito dura, uma notícia de disco voador surgia nas manchetes e o povo olhava para o céu e começava a se perguntar, de onde viemos e para onde vamos.
       A bagunça é um pouco isso aí. Para explicar a total falta de habilidade em cuidar de qualquer coisa, nada como arrumar uma atividade extra para os críticos e opositores se ocuparem. Tipo uma bagunça organizada.
      Formas de distrair a sociedade e não fazê-la pensar nos seus problemas são as grandes artimanhas para criar uma atividade extra e bagunçar alguma oposição que venha se organizando.
        Cabe a nós, quando ouvirmos alguém falando as coisas, analisar se é um indício de atividade ou apenas uma bagunça que vai se formando para esconder a incapacidade de mostrar uma atividade séria.

Origem da foto: Foto de Markus Spiske na Unsplash

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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