Opiniões

Antes que seja tarde

        O pôster acima deve mexer com o historiador, não que eu o seja, mas, também, me incomoda. Ao colocar duas bandeiras, a francesa com seus dizeres, e a brasileira destruída com dizeres derrotistas, penso que a História é ignorada, principalmente quando se misturam alhos com bugalhos e rasga-se a memória da História.
        A História conta-nos sobre a florescente civilização árabe, que nos deu além dos números, as traduções que nos ajudaram a entender civilizações antigas, sua arquitetura, seu vocabulário, e que é apagada pelas figuras de homens-bombas, radicais de uma cultura, como se não tivéssemos os radicais da nossa cultura ocidental, travestidos de homens de mercado.
      E é o mercado quem define as frases de Liberté, Égalité e Fraternité como libelos da sociedade capitalista ocidental.
        O Ocidente não pensou em Liberté quando seduziu os mandatários do mundo árabe, mundo esse que foi formado em divisões territoriais de interesses, ou deformado nas suas tradições na busca selvagem pelo petróleo barato. O Ocidente que não pensou em Égalité quando impôs a democracia ocidental em povos que não tinham essa tradição. E ignorou a Fraternité quando ajudou a massacrar as oposições ao avanço ocidental, contra o “atraso” daquelas instituições, que mal ou bem mantinham os enclaves culturais em harmonia, embora que tênue.
      A França, participante ou não dos conflitos deflagrados pela loucura Bush, calou-se, assim como o mundo Ocidental. Ninguém semeia ventos sem colher tempestades.
        Por outro lado, a tempestuosa verborragia sobre a “roubalité”, “impunité” e “retrocessé” na nossa bandeira, como se a exclusividade fosse nossa e não as houvesse em outros verbetes, seria outra se a “roubalité” não fosse exclusividade dos malfeitos de gente de bem, que até destroem rios ou se mostram a serviço de movimentos escusos, como o impeachment de uma presidenta, não é necessariamente uma “liberté”, e nem tampouco a “impunité” escondida em uma Justiça que separa ricos e pobres, política de situação e oposição, ou mesmo a “retrocessé”, que define através de ódios como transformar ciclistas em comunistas, não seja a “fraternité” esperada.
      Pregar a liberdade, a igualdade e a fraternidade não é jogar bombas ou destruindo culturas, rotuladas de “atrasadas”. Poderíamos ensinar a franceses, ingleses e americanos e outros povos mais ricos e assistentes de malfeitos, e também aos moradores deste Brasil, que temos muito a ensinar dizendo que “Libertas, ëqualitas e fraternitas quae sera tamen”, ainda é o melhor remédio contra sandices.

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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