Crônicas

A mentira como método

        Nas lutas entre grupos antagônicos, entre pessoas, entre países, o jogo se baseia não nas verdades históricas ou nas verdades sobre o que os atos significam. Nessas lutas, o principal não é dizer, claramente, o que se pensa mas o que se quer. Nelas, a mentira tem a prevalência porque faz parte de uma tática de desestabilização.
      É claro que uma verdade dita àqueles que tocam a mentira como mote não causa o menor efeito, porque a finalidade de tudo é vencer uma competição, uma contenda. E em uma contenda, assim como nas guerras, a informação tem um papel relevante.
      Mitos são construídos com base nas mentiras. Sim, porque são mitos, criações humanas para satisfazer uma verdade de um fato que se desconhece a origem. Criadas com o intuito de impor o medo, de fomentar a discórdia e derrotar o oponente sem que a consciência de quem pratica, as mentiras não causam o menor constrangimento aos praticantes.
         De tanto ouvir uma mentira, esse cansaço que ela causa torna o interlocutor farto de ouvi-la. O seu silêncio pode significar derrota diante de uma maioria que aceita e curte a mentira ou apenas desprezo.
        No entanto, o mentiroso vive dessa arte e não se conforma em ver que as suas mentiras não sejam aceitas pelo outro. Nesse sentido, o mentiroso sempre vai precisar sustentar a sua mentira porque entra por um caminho minado e sem retorno e, para ele, somente assim conseguirá se manter vivo e influente.
      A mentira não se constrói sozinha, ela precisa de eloquência, de preencher o vazio de alguém que necessita fomentar a fantasia que forjou em sua cabeça. E essa doença o leva a acreditar que o mundo funcionaria bem assim.
       Com a mentira nascem os ditadores e com a verdade morrem os heróis. A verdade é mais chocante do que a mentira. A verdade é um choque de realidade e a mentira não.
       Posso dizer que todo poder emana de um mito? E o dono dessa descrição, o autor dele é o responsável por difundi-la?
         Uma mentira se constrói na fantasia, é irreal mas, por um curto espaço de tempo, ela é capaz de transformar a irrealidade em algo palatável e aceitável. A mentira constrói impérios e fortunas. O blefe, esse parceiro elegante da mentira, funciona como o colchão de credibilidade que uma mentira precisa como suporte. Discursos de empreendedorismo, de manifestações de autoajuda, palavras bem arquitetadas mostrando as facilidades de um método para alcançar o sucesso são as receitas perfeitas para a montagem de um mundo de fantasia.
        Mentira são métodos para atrair incautos e ambiciosos, ambos similares na busca pela riqueza fácil e sem sustos. A mentira não gosta do trabalho, mas gosta de trabalhar para que ela convença o maior número de adeptos. E é, exatamente, a construção dessa base de apoio que sustenta a mentira.
        A mentira é um vício, arquétipo perfeito na mão do aproveitador e do oportunista. Quantos se calam diante dela quando veem que o efeito que ela causa pode trazer um benefício, mesmo que seja prejudicando o outro?
    A mentira como método é a ferramenta para construir um mundo irreal. E dentro das dificuldades de sobrevivência, somente um mundo irreal pode trazer algum conforto. Mesmo que seja por um período de tempo curto em que se pode enganar todos por pouco tempo.

Origem da foto: Foto de Jametlene Reskp na Unsplash 

VOCÊ CHEGOU ATÉ AQUI. SE GOSTOU ENTÃO CADASTRE-SE NAS NOTIFICAÇÕES OU POR E-MAIL. E RECEBA NOVOS POST.

Views: 5

Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

Obrigado por curtir o post