Opiniões

Têm dias que o meu sangue ferve

     E quando eu releio sobre as capitanias hereditárias, observo que elas persistem através do tempo, como um lagarto que se metamorfoseia, se esgueirando pelos cantos, passando pelos espaços das portas, rastejando, testando com a sua língua o ambiente mais propício. No melhor estilo dos coronelismos que se perpetuam do campo para a vida urbana, nas heranças dos oligopólios.
     Chego à Conjuração Mineira e vejo um movimento oligárquico, de pessoas ricas, querendo um Brasil para si, criando a moeda com lastro em ouro, a arquitetura de um Banco Central, isso no final do século XVIII, e a História, contada pelos vencedores, mostrando um louco à frente do único movimento contra o colonialismo na América do Sul.
     Para a desfaçatez das capitanias hereditárias teríamos a resposta fulminante da Conjuração (Inconfidência é o cacete!), que pecou pelo detalhe, o grande detalhe que persiste até hoje: a não convocação e a libertação dos escravos. Ainda o rico, branco, bem instalado, ignorando o resto.
     Somos o segundo país negro do mundo, perdemos apenas para a Nigéria. Meus olhos percorrem por onde eu ando, acordados, a despeito daqueles que pensam diferente de mim, me mandando abrir os olhos, observo onde estão os negros. E eles estão limpando o chão nos shoppings, fantasiados de seguranças, servindo refeições, guardando carros. E quando caminham pelos shoppings inspiram medo, desconforto, ou quando se sentam para uma refeição ou entram em uma loja, ou são “pegos” dirigindo um carro de melhor qualidade, são vistos com estranhamento (essa palavra sem sentido usada pelos intelectuais).
     O meu sangue ferve vendo uma passeata de brancos, indignados fazendo uma festa para aparecer na TV, com cobertura 24h, e direito a repeteco com os melhores momentos na segunda-feira, e eu tendo participado de manifestação onde o grosso era de sindicalistas, de membros de movimentos sociais, invisíveis para aqueles que curtem um dólar barato – o meu sangue ferve. Por que se ignora que nos movimentos sociais estão as mais justas reinvindicações, onde não se pede dólar barato e nem financiamento para carros. Pede-se um país mais justo. Mas, para alguns, são apenas comunistas.
     E o meu sangue ferve, porque a passeata branca não sabe nem o que é Comunismo, misturam alhos com bugalhos esbanjando sua ignorância política com cartazes dignos dos melhores stand ups, desfilando ao lado de símbolos nazistas, pedidos de intervenção militar, inquiridos por que estão ali, é uma mistura de coisas sem sentido. As opiniões são as mais estapafúrdias, desencontradas.
     O meu sangue ferve porque vejo de um lado a arrogância e o ódio, indo, alegremente, dar respaldo àqueles que figuram em listas de bancos estrangeiros, andam pelos paraísos fiscais, se beneficiam dos cofres públicos com financiamentos e bolsas propagandas, e convidam a que os outros abram os olhos.

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura