Crônicas

Sobre os pais

        Pai existe em tantos lugares que a gente nem percebe que tem. Existe pai na paixão que você sente, existe um pai na paisagem que você vê e quer abraçar de tão boa que é, existe pai até no país em que você vive. E é a primeira paixonite que a menina percebe.
         Pai é essa ausência que perdura por um dia inteiro, que você pouco vê quando amanhece, e quase adormece quando aquele suor, aquele cheiro de rua te abraça e aí sim você pode dormir de um cansaço diferente das gentes.
      Algumas lembranças vêm até nós, quando lembramos do pai. A minha, por exemplo, é uma tesoura grande quer cortava pipas de papel, enquanto ele trabalhava no recorte das roupas que minha mãe costurava. Os meus olhos no nível da mesa enxergavam aquela tesoura negra, imensa, e hoje, guardada na gaveta é tão pequena nas minhas mãos.
        É aquele ser que ensina coisas diferentes das mães, que fala coisas diferentes, de coisas da rua, da vida, que nos joga bem alto, e de nervoso nós enxergamos um mundo lá de cima, torcendo e torcendo para as mãos nos pegarem de volta, só para subir outra vez.
        Faz coisas diferentes, brinquedos de mãos, pregando pregos, aparando madeiras, tirando bambus dos matos e com cola e papel fazer um sonho voar pelo ar. Que conta as mesmas travessuras que você tem vontade de fazer.
        É um pouco indolente, que vê a barriga crescendo, sempre redonda e aconchegante, diferente da barriga da mãe que some, como por encanto, em troca de um irmão chorando.
        Ser pai é pedir carinho, e quando não tem fica no canto esperando, quem sabe no pedido de um conselho, ser pai também é ser contestado, e não pense que é errado você pensar diferente. É sinal de que a vida te chama e você está pronto para desafiá-la. E você nem imagina quem é que te deixou à vontade para aprender.
        Ser pai é quando o filho está no seu colo, ardendo de febre, e você olha para o lado para dizer: Pai, o que é que eu faço, e, na verdade, o pai é você. É decidir mais com o coração do que com o pensamento, é pelo instinto, dividindo com a mãe, porque pai não é sozinho, e mãe também não é. Por isso são dois, é difícil decidir, apesar de você achar que não.

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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