Crônicas

Sobre nossas escolhas

        Diante de uma encruzilhada, um caminho à direita outro à esquerda, qual deles tomar? O sentido clássico desta imagem é o processo da escolha. A vida é o encontro com as nossas escolhas: viver é escolher e se encontrar ou não no futuro.
        Em quase todas, podemos dizer que guardam um traço de arrependimento. Quando nos voltamos para rever nossas escolhas é porque um desencontro houve no futuro. Ninguém revê suas escolhas quando elas são felizes, acertadas, como frutos de uma decisão correta.
          Talvez o ledo engano nas escolhas seja esse julgamento de que decidimos correta ou incorretamente o caminho que tomamos. Uma escolha é para sempre. Revê-la nunca será a retomada do caminho, mas uma nova escolha que faremos adiante – correção de rumos, imaginamos nós.
          Cada um dos caminhos que tomamos pressupõe uma série de decisões a ser tomada dali por diante. Ou para continuar nesse caminho, ou para tentar de alguma forma consertá-lo. No entanto, esses processos vão envelhecendo com o tempo. Mesmo outra pessoa ou emprego envolvido vai com o tempo se modificando; as pessoas pelo fruto de nossas escolhas e o emprego pela própria dinâmica do mercado onde ele está inserido.
         Nossa escolha não é única. Nossa escolha envolve as escolhas de outros, que por isso mesmo acarretam escolhas em outros e, como o efeito borboleta vai nos afetar de alguma forma mais adiante, trazendo o arrependimento ou não pela escolha inicial. Quando entramos na vida de alguém e, por conseguinte, esse alguém entra em nossas vidas, nossas escolhas sofrem o efeito da consequência, porque nossas atitudes serão pensadas não mais como atitudes individuais, mas como atitudes responsáveis para com o outro. Por isso, nossas escolhas são tão difíceis, porque envolvem renúncia. E renúncia não é algo bom para se comemorar.
         A renúncia pressupõe colocar nas mãos do outro nosso destino. Nós modificamos nossa maneira de pensar, agir, em função da permanência do outro ao nosso lado, e isso envolve nossa vida profissional também. Permanecemos em algum emprego nem tanto pelo nosso desejo, nosso gosto, permanecemos também pelos motivos da sobrevivência.
        Nossos desejos se acomodam na medida do possível, e os desejos reais vão procurar a culpa nas escolhas pela sua não realização.
       A memória é o recurso que possuímos para rever nossas escolhas. Nelas, podemos reconstruir o passado e imaginar um futuro a nosso modo. Mas ele é fantasia, tendo em vista que as escolhas dos envolvidos passam pela nossa maneira de pensar. Isso é irreal: fazermos as escolhas pelos outros.
      Em vista disso, a escolha é irrecuperável, não podemos desistir dela ou descartá-la. Desistir de nossas escolhas é o mesmo que desistir de ser humano. Ao contrário dos animais que são perseguidos por outro mais forte, que precisam permanecer acordados e alertas todo o tempo, podemos nos sentir como a onça que os caça. Dorme tranquilamente, e quando sai à caça, com certeza encontrará sua comida, porque ninguém consegue ficar alerta todo o tempo.
       Ao caçador cabe escolher a caça, ao caçado não ser o escolhido do dia. Escolher é a caça, nossas escolhas o motivo da caça. E nem sempre é o dia das nossas escolhas.

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Nilson Lattari

Nilson Lattari é carioca, escritor, graduado em Literatura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Gosta de escrever, principalmente, crônicas e artigos sobre comportamentos humanos, políticos ou sociais. É detentor de vários prêmios em Literatura

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